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terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Suicídio

Todas as vezes que alguém comete um suicídio eu fico meio pensativa. Fico refletindo sobre a vida, sobre as pessoas, fico só observando a vida meio de longe o dia todo.

A vida é passageira ou a gente é passageiro dela?  Pessoas que tiram a sua própria vida é como se estivessem vendo a vida passar ali da janela do ônibus só esperando a próxima parada pra descer, antes mesmo de chegar no seu destino final. Loucos pra acabar logo com essa viagem, ao invés de apreciar a paisagem, saborear cada quilômetro que se roda. Têm alguns quilômetros que parecem que não vão passar nunca. Mas têm outros que dá vontade de pedir para o motorista voltar só pra gente passar mais uma vez por ali. Talvez mudando de poltrona pra ver de um ângulo diferente a mesma coisa.

Desistir de tudo assim tão fácil? As pessoas que tentam fugir do problema viajando eu até entendo, mas viajar dessa pra "melhor" é difícil de aceitar. Às vezes penso: eu nunca teria coragem. Mas seria coragem ou fraqueza? Porque coragem seria se a pessoa enfrentasse seja lá qual for a situação que estivesse passando.

Vejo tantas pessoas desistindo. Todos os dias tem alguém saltando do ônibus. Larga do trabalho no primeiro obstáculo que aparece, desiste do namoro na primeira briga, desiste de um curso na primeira falha que cometer. Tem aqueles que ficam pulando de poltrona em poltrona porque colocam defeito em todas, seja o chefe, o namorado, o emprego, um instrumento musical, ou até um carro. Estão sempre insatisfeitas. Nada compensa, porque não conseguem ver algo de bom naquilo que incomoda. E ao não saberem lidar com a situação, preferem pular fora, partem pra outra.

Sempre achei que o tipo de pessoas que faziam isso era o mesmo. Mas tenho me surpreendido. As pessoas ultimamente estão tão preocupadas em passar para os outros que estão bem, que quando menos se espera alguém que você nunca desconfiaria que sofre de depressão comete suicídio sem deixar vestígios do porquê, sem ter nenhum motivo aparente nem para os mais íntimos. Fico pensando se é coisa de um momento, de uma fase, ou se isso já vem de tempo, se a pessoa já tem propensão a fazer este tipo de coisa.

Desde que comecei a trabalhar com crianças vejo que esta insatisfação já começa cedo a se pronunciar. Elas mal iniciam algo e já desistem por qualquer problema que houver. E são difíceis de negociar. Não têm foco, não têm persistência. Se tivessem que criar algo como um Titanic, não sairia do papel ou afundaria antes mesmo de sair em alto mar. Não consigo imaginá-los alçando altos vôos. Como imaginá-los em uma viagem longa, se os vejo escolhendo o livro pelo número de páginas? O que será no futuro? Fico ali observando e imaginando-os como serão como adultos. Frustrados, no mínimo, não terminaram nada. Ou nem começaram. Vejo-os tão sem iniciativa. Muito raro quando alguma ideia parte deles. Só consigo os ver partindo da ideia, fugindo de criar algo com suas próprias mãos.

Fico pensando, somos nós que podamos essas crianças? Somos nós que não estamos sabendo valorizar o que eles têm de melhor? Estamos levando eles ao suicídio de sua própria personalidade? Gostaria que a viagem terminasse diferente. E que todos chegassem ao final tendo apreciado o caminho que percorreram. Que não quisessem desistir, que tentassem ao menos arriscar indo um pouco mais além. Por mais difícil que esteja o tempo, seguissem a viagem tranquilos de que qualquer tempestade não perdurará. E que o sol que virá no dia seguinte os fizesse querer estar ali ainda, nessa viagem que a gente nunca sabe a hora que acaba. Que comprem uma nova passagem, mas sigam em frente. #partiu #aproveitaravida